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gnorar metade do Brasil tem custado caro às marcas. A nova edição do estudo “O Brasil Invisível”, conduzido pela Data-Makers em parceria com a Gerando Falcões e a ESPM, mostra que a população de baixa renda — que representa cerca de 50% dos brasileiros — permanece fora do radar das estratégias de comunicação e Marketing, mesmo diante de seu tamanho e potencial.
Mais da metade (60%) dos consumidores das classes D e E não se sentem representados pela publicidade — o maior índice entre todos os grupos sociais analisados. Essa sensação de invisibilidade se reflete diretamente nas decisões de compra: 53% já deixaram de adquirir um produto ou serviço por causa de um anúncio que os desagradou.
Em um país onde a base da pirâmide demográfica ainda é tratada como um público secundário, a falta de conexão emocional e contextual entre as campanhas e a realidade dessas pessoas abre uma lacuna estratégica enorme, que pode significar tanto perdas financeiras quanto oportunidades de crescimento.
A pesquisa, realizada com 2.002 pessoas em todas as regiões do país, entre agosto e setembro de 2025, mergulha nos hábitos de consumo de mídia, comportamento, valores e percepções das classes D e E, revelando um consumidor altamente conectado, exigente e distante da forma como as marcas ainda se comunicam.

Digital no centro dos interesses
O levantamento mostra que a baixa renda rompeu definitivamente com o estereótipo da exclusão digital. O acesso à internet é praticamente universal, com 91% dos entrevistados utilizando a rede todos os dias — índice equivalente ao das classes mais altas. O smartphone é o principal dispositivo de conexão, o que torna essencial o desenvolvimento de estratégias mobile-first.
As redes sociais dominam a preferência e a atenção: Instagram (23%) e YouTube (20%) são os canais favoritos, superando amplamente a TV aberta, que aparece com apenas 9% de preferência. Mesmo assim, 65% ainda mantêm o hábito de assistir à televisão aberta diariamente, embora quase um terço assista raramente ou não assista — um padrão de comportamento similar ao da Geração Z.
O tipo de conteúdo consumido também expõe a mudança de paradigma. Entretenimento supera informação em todas as categorias: filmes e séries lideram com 75% de preferência, seguidos por humor (53%) e esportes (50%). A busca por momentos de descontração e leveza se sobrepõe ao interesse por notícias, enquanto reality shows e programação adulta aparecem no topo das rejeições.
Esse perfil reflete não apenas um consumo mais ativo e seletivo, mas também a necessidade de campanhas que conversem com o desejo por entretenimento sem deixar de lado relevância e propósito.

Influência com propósito
Quando o assunto são influenciadores, a pesquisa revela nuances importantes. Apenas 25% dos consumidores de baixa renda consideram que essas figuras são determinantes na decisão de compra, e 38% afirmam já ter comprado por recomendação.
Por outro lado, o engajamento não se traduz automaticamente em rejeição: apenas 27% deixaram de comprar algo por não gostarem de um influenciador. O que realmente pesa é a identificação: trajetória de vida, histórico de superação e alinhamento de valores são os atributos mais valorizados. A religião, frequentemente considerada um fator decisivo nesse segmento, aparece como um critério menos relevante, com apenas 13% destacando sua importância.
Os critérios éticos e comportamentais, no entanto, exercem grande influência. Histórico de violência (52%) e problemas com a lei (51%) são os principais motivos de rejeição, seguidos por traição conjugal e intolerância religiosa.
Quando se trata de ações de Marketing com figuras públicas, campanhas de doação (55%) e de conscientização (49%) lideram a preferência, indicando que a associação a causas sociais e impacto coletivo é uma estratégia eficaz para marcas que buscam engajamento genuíno com essa audiência.

Publicidade desconexa
Na publicidade, o abismo entre marcas e público se amplia. A rejeição é majoritariamente provocada por campanhas com apelo sexual, linguagem vulgar, cenas de violência e promoção de causas polêmicas como a legalização das drogas ou o aborto — todos fatores que afastam esse consumidor.
Em contrapartida, anúncios com histórias inspiradoras (52%), apoio à família (43%) e promoção de causas sociais (51%) são os que mais motivam compras. As mensagens que mais geram aceitação estão ligadas ao combate à fome (69%), à promoção da paz e justiça social (58%) e ao fortalecimento dos laços familiares (51%).
O estudo deixa claro que o desafio para as marcas vai muito além de “falar com” a baixa renda: é preciso “falar como” ela, respeitando seus valores, seus hábitos e seu contexto. Com metade da população brasileira se sentindo invisível na publicidade, entender esse público — conectado, conservador em valores e guiado por identificação pessoal — não é apenas uma questão de representatividade.
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